Mais de R$ 113 milhões em contratos são
investigados por irregularidades no Cabo de Santo Agostinho
Além
de fraudes no fornecimento de merenda, Operação Ratatouille investiga doação a
cantor gospel e compra de materiais escolares incompatíveis com idade dos
alunos.
Polícia Civil
informou, nesta quinta (22), que mais de R$ 113 milhões em contratos entre a
Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho, no Grande Recife, e oito empresas
privadas são investigados na Operação Ratatouille. Fraudes no fornecimento de merendas
para escolas do município, superfaturamento de contratos e enriquecimento
ilícito são algumas das irregularidades apuradas.
Segundo a polícia, os alimentos que eram
entregues nas escolas vinham em menor quantidade do que o estabelecido no
contrato e com qualidade inferior ou até apodrecidos. Os crimes investigados
ocorreram na gestão do prefeito José Ivaldo Gomes, conhecido como Vado da
Farmácia (ex-PSB), entre 2013 e 2016.
A operação é realizada em conjunto pela
polícia, pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE) e pelo
Ministério Público de Pernambuco (MPPE), de onde partiram as primeiras
denúncias. Na quarta (21), foram cumpridos 20 mandados de busca e apreensão,
além de três mandados de sequestro de bens móveis no Grande Recife e na Zona da
Mata Sul do estado.
A investigação começou a ser conduzida seis meses antes
dos mandados de busca e apreensão. O caso foi iniciado por causa de denúncias
da população ao MPPE sobre serviços que deveriam ser prestados no município e
não foram assim como por causa dos bens ostentados por parentes de Vado da
Farmácia nas redes sociais. Segundo os órgãos fiscalizadores, esses bens seriam
incompatíveis com a renda e a declaração de bens do ex-prefeito.
De acordo com a delegada Patrícia
Domingos, titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Administração e
Serviços Públicos (Decasp), Vado declarou não ter nenhum imóvel quando entrou
na prefeitura. Porém, após a gestão, foi verificado um patrimônio 150% maior
que o compatível à renda dele.
"Ao que tudo indica, tudo estava registrado no nome
de 'laranjas’. Constatamos a existência de bens como dois jetskis, dois
quadriciclos, uma lancha, um carro de luxo da marca Porsche, duas casas de
veraneio e uma motocicleta de luxo. Alguns deles, pagos à vista. Por exemplo, a
babá do filho dele teria dado de presente ao garoto uma motocicleta de R$ 70
mil”, explicou a delegada.
Nas casas dos investigados, a
polícia também apreendeu mais de R$ 1,3 milhão em espécie. As contas bancárias
dos alvos foram bloqueadas pela Justiça até o fim da investigação.
Do valor apreendido pela polícia,
1,2 milhão estava na casa do ex-secretário executivo de logística do Cabo,
Paulino Valério da Silva Neto, que mantinha as cédulas em caixas de sapato, em
dólares, euros, pesos e libras. Ele ocupa, atualmente, o cargo de secretário de
Planejamento e Gestão na Prefeitura de Ipojuca, também no Grande Recife, e não
foi localizado para falar sobre as denúncias.
Caixas
de sapato com dinheiro em moedas nacionais e internacionais foram encontradas
na casa de um dos investigados da Operação Ratatouille (Foto:
Divulgação/Polícia Civil)
De acordo com a promotora Alice
Morais, do MPPE, não foi pedida a prisão de Vado ou dos outros envolvidos por
não haver, por enquanto, indícios que justifiquem a prisão, como destruição de
provas ou fuga.
“Recebemos as denúncias seja pelo
Disque-Denúncia, seja pela ouvidoria, e apuramos os fatos junto ao TCE. Essa é
uma fase inicial da investigação e pode resultar em outras, com consequências
mais assertivas”, explicou a promotora.
O ex-prefeito Vado da Farmácia não
foi localizado para falar sobre as denúncias contra ele.
Mais
irregularidades
Uma das
empresas que ainda mantém contrato licitatório com a prefeitura é a Casa de
Farinha, responsável por fornecer alimentos a três secretarias do município. Os
contratos investigados, firmados entre 2013 e 2016, somam R$ 29 milhões.
“Quando eram entregues, os alimentos
estavam estragados, carnes misturadas com soja e de péssima qualidade, feijão
com fungo, merenda com mau cheiro e há, inclusive, um relato de que as escolas
recebiam um único peito de frango para preparar canja para 300 alunos. Para algumas
dessas crianças, é a única refeição do dia”, explicou Patrícia Domingos.
Outra das empresas eram
construtoras, que também são investigadas na Operação Tupinambá,
que provocou o afastamento do prefeito e quatro servidores de São Lourenço da
Mata, no Grande Recife. A estimativa é que tenham sido desviados ao menos R$
223 mil. Uma gráfica, que fornecia kits escolares à cidade, também é
investigada por superfaturamento.
“Outra coisa que nos chamou muito a
atenção era a incompatibilidade dos materiais para a idade do público. Por
exemplo, eram supostamente enviados apontadores para crianças do berçário e
massa de modelar para idosos. Além disso, tudo entregue com incompletude”,
disse Patrícia.
Cantor gospel
A polícia
também verificou uma doação de R$ 200 mil para uma gravadora, que teria sido
contratada para produzir um CD e um DVD do cantor evangélico André Valadão, sem
que houvesse nenhum tipo de contrapartida para a prefeitura.
“Ao poder público, não é permitido
doar dinheiro para projetos de pessoas particulares, desse jeito. Não houve
sequer algum tipo de propaganda do município, um show, e isso configura o crime
de desvio de rendas públicas, que tem pena de dois a 12 anos de prisão. Além
disso, o material acabou sendo gravado por outra empresa. Ou seja, a prefeitura
doou dinheiro irregularmente para gravação de um CD que sequer foi realizado”,
explicou a delegada.
Em vídeo divulgado em 2015, durante
a polêmica sobre a doação realizada pela prefeitura, o cantor publicou um vídeo
em seu perfil no Facebook com a seguinte mensagem: "A verba que nós
estamos recebendo da Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho não é um cachê para
o André Valadão. Ela é colaborativa, para ajudar a estrutura, a montagem e
construção de parte desse DVD, que nós escolhemos gravar no Cabo, em
Pernambuco".
0 comentários:
Postar um comentário