Em
conversas mais recentes, Barbosa indicou que pretende conciliar a bandeira
ética com a social
Publicado em: 26/04/2018 11:59
O ex-presidente do Supremo Tribunal
Federal Joaquim Barbosa (PSB) mantém em suspense a decisão de disputar ou não o
Palácio do Planalto, mas já tem esboçado os pilares do discurso que deverá
adotar em uma eventual campanha. Em conversas mais recentes, Barbosa indicou
que pretende conciliar a bandeira ética com a social. O ex-relator do mensalão
quer reforçar a imagem do juiz implacável com a corrupção e, ao mesmo tempo, se
apresentar na economia como um social-democrata, favorável ao livre mercado,
mas com ênfase no combate à miséria.
"Não sou favorável a posições
ultraliberais num país social e estruturalmente tão frágil e desequilibrado
como o Brasil, com desigualdades profundas e historicamente enraizadas",
afirmou Barbosa ao jornal O Estado de S. Paulo. "Basta um rápido olhar
para o chamado Brasil profundo ou para a periferia das nossas grandes
metrópoles para se convencer da inadequação à nossa 'engenharia social' dessas
soluções meramente livrescas, puramente especulativas. Evidentemente, elas não
são solução para a grande miserabilidade que é a nossa marca de origem e que
nós, aparentemente, insistimos em ignorar."
O interesse pelo pensamento de Barbosa
invadiu os círculos do mundo político e econômico após ele se filiar ao PSB no
início do mês e aparecer bem posicionado em pesquisas de intenção de voto. A
avaliação corrente é de que o ex-ministro do Supremo tem alto potencial
eleitoral, porque teria capacidade de arregimentar votos em diferentes polos
ideológicos.
No Supremo, Barbosa foi o relator do
mensalão federal, que resultou, em 2012, na condenação e prisão de integrantes
da antiga cúpula do PT. Após se aposentar, em 2014, ele se tornou um crítico do
impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff. O ex-ministro tem evitado se
manifestar sobre a condenação e prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
Barbosa foi um defensor da
possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, tema que hoje
divide o Supremo. Sua atuação na Corte, aliás, deverá ser bastante explorada
numa eventual campanha presidencial. Além da marca do mensalão, ele reivindica
o papel de principal articulador da aprovação, no Supremo, da proibição das
doações eleitorais de empresas. Em conversa com um antigo aliado, ele
considerou essa decisão como "crucial" para uma depuração do sistema
político nacional.
Em 11 de dezembro de 2013, o então
presidente do Supremo colocou em julgamento a ação direta de
inconstitucionalidade (ADI) 4650, sobre financiamento de campanhas eleitorais e
votou contra doações de pessoas jurídicas. "A permissão para as empresas
contribuírem para campanhas e partidos pode exercer uma influência negativa e
perniciosa sobre os pleitos, apta a comprometer a normalidade e legitimidade do
processo eleitoral, e comprometer a independência dos representantes",
afirmou na época em seu voto.
Nesse tema, ele enfrentou a oposição de
Gilmar Mendes, que pediu vista e devolveu a ação ao plenário um ano e cinco
meses depois. A conclusão da votação ocorreu em 2015, já com Barbosa fora do
Supremo.
Administração
O ex-ministro ainda tenta se acostumar
ao assédio após ingressar pela primeira vez em um partido político e entrar de
vez no rol dos presidenciáveis. Barbosa acompanha com mais atenção a
curiosidade em torno de suas posições e suas alegadas fragilidades: o
temperamento muitas vezes explosivo e a falta de experiência administrativa. O
segundo ponto lhe incomoda mais.
Doutor e mestre em Direito Público por
universidades francesas, Barbosa reclama que tem uma vasta carreira e conhece a
administração federal do Brasil como poucos. Antes de sua nomeação para o
Supremo - onde ficou por 11 anos -, ele foi integrante do Ministério Público
Federal de 1984 a 2003, com atuação em Brasília e no Rio. De 1985 a 1988,
trabalhou no Executivo ao chefiar a consultoria jurídica do Ministério da
Saúde.
"Conheço muito bem o Estado
brasileiro, suas virtudes, seus defeitos, visíveis ou invisíveis. Nele
trabalhei desde muito jovem, nas mais diversas esferas, dos níveis mais
modestos aos mais elevados", afirmou Barbosa ao jornal.
Autores
Desde que se filiou ao PSB, há 20 dias,
o ex-ministro recebeu diversos convites de economistas e escolas, dispostos a
entender o que ele pensa sobre o tema. Segundo interlocutores, Barbosa tem
pouca familiaridade com economistas nacionais e costuma se informar por meio da
leitura de autores estrangeiros.
Acompanha semanalmente o americano Paul
Krugman, professor da Universidade de Princeton, vencedor do Nobel de Economia
de 2008 e colunista do The New York Times. Krugman é um adepto do
keynesianismo, teoria baseada nas ideias do inglês John Maynard Keynes, que
defendia a ação do Estado na economia.
O ex-ministro também é admirador e
leitor de Francis Fukuyama, cientista político e economista que foi um do
ideólogos do governo Ronald Reagan nos Estados Unidos, além de autor de
best-sellers. Um terceiro nome que Barbosa costuma citar em rodas de conversa é
o economista francês Thomas Piketty, que ganhou fama internacional em 2013 com
seu livro O Capital no século XXI.
No ano passado, o ex-presidente do Supremo
se encontrou com Eduardo Giannetti para tratar do cenário eleitoral, mas a
intenção do economista ligado a Marina Silva era tentar uma aproximação dele
com a pré-candidata da Rede. "Conversamos de tudo, menos economia",
disse Giannetti, que saiu do encontro convencido de que uma dobradinha
Marina-Barbosa se mostrou "inexequível".
A decisão sobre uma candidatura
presidencial ainda é um dilema pessoal para o ex-ministro. Após deixar o
Supremo, ele passou a atuar como advogado focado na elaboração de pareceres
jurídicos. A experiência na mais alta Corte do País e o notável currículo
acadêmico lhe garantem alto rendimento financeiro. A opção pela política teria
impacto na vida de familiares.
Manifesto
Essa situação, segundo aliados de
Barbosa, deixa o PSB "ansioso". A bancada do partido na Câmara vai
divulgar em breve manifesto para pressionar o ex-ministro a lançar a
pré-candidatura. "(Barbosa) tem demonstrado identidade com valores caros
ao ideário do PSB, como a defesa de uma sociedade plural, humanista, inclusiva
e diversa, sem preconceitos", afirma o texto.
Nos cenários do mais recente
levantamento do Datafolha, que incluem ou excluem Lula, o ex-ministro alcança
de 8 a 10 pontos porcentuais e fica à frente ou empatado (dentro da margem de
erro) de pré-candidatos já consolidados como Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro
Gomes (PDT). Na pesquisa Ibope/TV Bandeirantes divulgada nesta terça, 24, e
feita com eleitores do Estado de São Paulo - maior colégio eleitoral do País,
com 33 milhões de votantes -, Barbosa chega a 10% da preferência, empatado
tecnicamente com Marina em cenários sem Lula.
Antes de se filiar ao PSB, no início de
abril - prazo final da legislação -, Barbosa conversou com dezenas de
interlocutores por cerca de um ano. No momento, segundo pessoas próximas, sua
maior preocupação é evitar que uma candidatura seja tratada como automática
caso seu nome continue bem avaliado nos levantamentos eleitorais. O ex-ministro
ainda joga com o tempo.
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